Caixa deve deixar o patrocínio no futebol
Banco investiu R$ 191,7 milhões no futebol brasileiro em 2018; novo governo contesta política de publicidade do banco estatal

No fim de 2018, o Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu que o patrocínio da Caixa Econômica Federal ao esporte nacional é irregular. Esta resolução pode fazer com que o banco deixe de usar dinheiro público para promover a marca em clubes e federações de futebol, por exemplo. Isto é, a Caixa está pressionada a não renovar os contratos para 2019.
Apesar da decisão do TCU, a Caixa não é obrigada a desfazer os contratos ou não renová-los. Atualmente, a instituição financeira ainda tem acordos vigentes com o Botafogo, até 28 de fevereiro, e com o Sport, até 28 de maio. Em contato com o Futebol Brasil, a Caixa reduziu-se a dizer que os "patrocínios esportivos da Caixa estão sob análise".
Mesmo nesse contexto de análise de seus repasses, o banco está conversando com clubes sobre uma possível renovação. Nos bastidores, fala-se que, se a Caixa mantiver o aporte no esporte nacional, irá reduzir drasticamente os valores, principalmente no futebol.
Segundo a Folha de São Paulo, a Caixa gastou R$ 191,7 milhões em patrocínios a 24 clubes e a alguns campeonatos em 2018. O valor representa 28% do orçamento destinado à publicidade. O banco começou a patrocinar equipes do futebol brasileiro em 2012, quando assinou com Athetico-PR, Avaí e Figueirense. No total, a Caixa gastou R$ 663 milhões com o futebol.
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O novo governo, empossado em 1 de janeiro, já criticou o envolvimento da Caixa com o futebol. O patrocínio já foi alvo de críticas do presidente Jair Bolsonaro e do ministro da economia Paulo Guedes, que afirmou que "é possível fazer coisas 100 vezes melhores com menos recursos do que gastar com publicidade em times de futebol".
Com a perda da Caixa, os clubes brasileiros precisarão angariar novas fontes de receitas e, consequentemente, fazer a agremiação funcionar. Porque, mesmo com o patrocínio da instituição financeira, a conta de muitos clubes já não fecha. O Corinthians, por exemplo, antecipou-se e assinou com o banco BMG, novo patrocinador máster do clube. No fim da matéria, confira um bate-bola com Fernando Ferreira, consultor da Pluri Consultoria e especialista em marketing esportivo.
Quem mais recebeu do banco em 2018 foi o Flamengo, com contrato de R$ 25 milhões. Santos (R$ 10,8 milhões), Botafogo, Cruzeiro e Atlético-MG (R$ 10 milhões) aparecem logo em seguida.
PERDA IMPORTANTE!
— Futebol Brasil (@futbraoficial) 24 de janeiro de 2019
Confira matéria sobre a possível perda de patrocínio da @Caixa em 2019 ao futebol! O banco deve diminuir os repasses ou deixar de vez o apoio ao esporte. Confira também entrevista com o especialista Fernando Ferreira: https://t.co/GtGyf6D5tQ! pic.twitter.com/F0dXHsAICO
Recém-promovido à Série A, o CSA recebeu R$ 1,5 milhão da Caixa em 2018 e já possui propostas de outras marcas para o patrocínio máster. O Azulão é uma das equipes que estão se reunindo com a Caixa para acertar detalhes de renovação. Como na primeira divisão a exposição é maior, o clube alagoano trabalha com a ideia de uma valorização maior da marca e, com isso, barganhar valores mais altos de patrocínio para 2019.
Os alagoanos se reuniram nas últimas semanas com a instituição financeira e seguem aguardando uma definição do caso. Alguns dirigentes já admitem perder o aporte do banco.
A Caixa já pediu a clubes que estão em processo de renovação que deixe de usar a logo do banco nos uniformes. Antes, a instituição pedia para manter enquanto discutia a extensão do contrato. O fato pode ser um indicativo que a Caixa está deixando o futebol ou está agindo com mais cautela aos olhos do TCU.
Confira um bate-bola com Fernando Ferreira, especialista em marketing e consultor da Pluri Consultoria:

Reprodução/Twitter
Futebol Brasil: A Caixa criou dependência dos clubes brasileiros com os patrocínios a eles? Houve uma acomodação?
Fernando Ferreira: Não digo que foi acomodação. Boa parta dos clubes tem buscado uma alternativa à Caixa desde que começaram os rumores de que sairia do futebol, que não são de agora. A saída da Caixa começou desde quando entraram, houve muita controvérsia. A Caixa ocupa um espaço que dificilmente será ocupado por outros no mercado brasileiro.
Alguns clubes tentam ao modo deles achar outras empresas. A falta de credibilidade faz com que as empresas fiquem longe do futebol. Diria que a Caixa foi um peixe fora d’água nesse contexto. Lá na Copa União, teve a Coca-Cola, que patrocinou todo mundo pelo contrato com a organização. O mercado de patrocínio vive uma crise. Hoje, temos coisas pontuais, como a Unimed, a Crefisa. A velha ilusão dos clubes com patrocínio máster é complicada no Brasil. Temos uma crise econômica, retração do mercado. E o futebol brasileiro teima em não correr atrás da credibilidade. Não atacamos o verdadeiro problema. A saída da Caixa dificilmente será ocupada por outra empresa.
Pega a Argentina como exemplo, criaram uma liga independente. É uma entidade que gere de maneira autônoma que já alcança resultados. Aqui, não conseguem se unir. No nosso contexto, combina-se crise econômica e crise de credibilidade, que é crônico. Enquanto não entenderem isso, sempre estarão com pires na mão dependente de um movimento estatal.
FB: Como você vê o investimento da Caixa no esporte/futebol? Foi mais importante para quem?
FF: O histórico de relação do setor financeiro com futebol é muito positivo, os resultados tendem a ser positivos. Sem as informações disponíveis, temos o fato de a lista de patrocínios mais longevos do futebol brasileiro serem do setor financeiro. Vemos que está sempre mais presente. Tem a Crefisa, que está feliz no Palmeiras. Há o BMG, que nunca sai do futebol. O banco Inter no São Paulo, onde os resultados foram bem positivos. No Rio Grande do Sul, tem o Banrisul há muito tempo. Os bancos hoje são bastante lucrativos. O Itaú não patrocina os clubes diretamente, mas também nunca sai do futebol.
É o setor que mais investe historicamente no futebol e que consegue bons resultados. Quando a Caixa entrou, especulou-se que fosse decisão política. Mas o patrocínio continuou ao longo dos governos. Ampliaram o apoio nas gestões dos ex-presidentes Dilma Rousseff e Michel Temer, quando chegaram ao auge. Ninguém está aí para rasgar dinheiro. O problema com patrocínio no futebol são aquelas marcas iniciantes, que gastam muita grana, mas depois não têm mais dinheiro para investir. Não há estratégia. Isso é muito comum. Imagino que o resultado para a Caixa tenha sido positivo, sim, pela ampliação ao longo dos anos.
FB: Em caso de perda do contrato com o banco, o mercado está favorável para os clubes conseguirem outras fontes de receita de patrocínio?
FF: O mercado publicitário brasileiro olha muito pouco para o futebol. Duas coisas que são importantes. A primeira é que sempre há mercado, as empresas não param de investir. Se não escolhem o futebol, colocam dinheiro em outro lugar. A questão é o futebol perder para outros setores. Se o trabalho é bem feito, tem mercado. Segundo que os ares da economia deram uma melhorada, até por questões conjunturais, após uma depressão econômica prolongada. É um ambiente mais propício este ano que nos anos anteriores, principalmente no pós-Copa.
A perspectiva de mercado agora é mais positiva. Não é perfeito, mas há uma perspectiva de crescimento econômico. O ponto fundamental, no longo prazo, é gerar valores, com trabalho de mostrar que o futebol não é um mercado marginal. Hoje, o histórico do futebol se posiciona como mercado marginal: tem violência, corrupção, não é transparente. Isso tem que ser invertido.
Em nenhum segmento os corações e mentes são impactados quanto o futebol, que tem um retorno de marca excepcional. Futebol é muito grande para ficar com o pires na mão. Os números são muito distantes da realidade. É o efeito da falta de credibilidade.