Opinião: racismo e preconceitos seguem manchando o futebol
Novos casos de intolerância aconteceram no Brasil e na Ucrânia neste domingo

O futebol tem como principal característica a democracia. Pode se vangloriar de ser um esporte plural, de todos. No entanto, essa realidade contrasta com o que há de mais podre na sociedade: a intolerância.
No último fim de semana, dois casos de racismo chamaram a atenção da opinião pública. Um foi no Brasil, no clássico disputado entre Cruzeiro e Atlético-MG neste domingo, no Mineirão. O outro foi no Campeonato Ucraniano, envolvendo os brasileiros Taison e Dentinho.
A confusão no Mineirão
Durante confusão nas arquibancadas, "torcedores" do Galo hostilizaram um segurança do estádio. Em dado momento, dois homens - demasiadamente alterados - batem boca com o funcionário da Minas Arena, que também recebeu uma cusparada no rosto.
Só isso já é motivo de revolta, mas um dos homens - farei de tudo para evitar o termo torcedor - foi além e mandou o segurança prestar atenção na cor dele, num ato claro de injúria racial, querendo diminuí-lo por ser negro.
O agressor também usou um termo homofóbico para atingir o funcionário do estádio (assista abaixo a imagem revoltante). Não bastasse isso, o clássico terminou com briga generalizada, o que fez com que autoridades mineiras cogitassem o retorno de torcida única no estado.
Dois torcedores do Atlético Mineiro são racistas com seguranças do estádio Mineirão durante jogo do time. Racismo é crime! #NãoPassarão pic.twitter.com/t24vgVc5wj
— Mídia NINJA (@MidiaNINJA) November 11, 2019
- Passei a noite em claro, minha esposa não foi trabalhar hoje. Ela está comigo aqui. Só tenho ela aqui, sou do Rio de Janeiro. Meus filhos moram no Rio, são adolescentes. Quando a ficha caiu, fiquei muito chateado. Meus filhos fizeram contato e disseram que viram na rede social: 'Ele cuspiu na sua cara'. Aí eu disse não foi bem assim, disfarcei - contou.
O racismo na Ucrânia
A partida entre Shakhtar Donetsk e Dínamo Kiev, pelo Campeonato Ucraniano, foi marcada por racismo por parte da torcida do Kiev. As vítimas foram os jogadores brasileiros, gerando a revolta de Taison e Dentinho.
Taison, que está em sua 10ª temporada no futebol ucraniano, não se calou e respondeu a torcida, chegando a chutar a bola em direção aos agressores nas arquibancadas.
Despreparada e sem saber lidar com a situação, a arbitragem expulsou Taison, que saiu de campo chorando. A punição da vítima, legítima inversão de valores. Cogitou-se o encerramento da partida, mas ela reiniciou minutos depois.
Apoio e revolta nas redes sociais
Ambos os casos geraram revolta nas redes sociais, além de mensagens de apoio ao segurança e aos jogadores brasileiros na Ucrânia.
A hashtag "#RacismoNuncaMais" ficou entre os assuntos mais comentados do dia no fim de domingo e nesta segunda-feira. Diversas personalidades se manifestaram, entre elas Thiago Neves, meia do Cruzeiro, repudiando o fato ocorrido no clássico.
Clubes também se manifestaram para reforçar o quanto esses episódios são extremamente lamentáveis, para marcar território contra o preconceito e a intolerância.
Ex-clubes de Taison e Dentinho, Internacional e Corinthians também fizeram as suas partes.
Até quando? 😢
— Corinthians (@Corinthians) November 10, 2019
Muita força a @dentinho e Taison, que lamentavelmente foram vítimas do asqueroso racismo no jogo entre Shakhtar Donetsk e Dínamo de Kiev, na Ucrânia, hoje.#SayNoToRacism #NoToRacism #RacismoNuncaMais pic.twitter.com/Zl0lAXJbe3
Nota do Atlético-MG
O Atlético-MG, time do agressor do segurança, também usou as redes sociais para repudiar o racismo, dentro e fora do estádio.
Além de uma simples nota, o clube também deve ajudar as autoridades para identificar o "torcedor", para que ele responda pelos seus atos judicialmente. E se for sócio, deve sofrer punição ou até expulsão do quadro de associados.
O Galo também, sem qualquer determinação do STJD, deveria criar campanhas de conscientização contra a intolerância, usando as redes sociais e os dias de jogos para atingir diretamente o torcedor.
O Clube Atlético Mineiro repudia veementemente qualquer ato de violência, incluindo racismo, injúria ou ofensa moral, seja no estádio ou fora dele.
— Atlético (@Atletico) November 11, 2019
As diversas imagens que circulam em redes sociais são lamentáveis e devem ser objeto de rigorosa apuração. pic.twitter.com/Pg5wY3nLCf
Taison se manifesta nas redes sociais
Ainda no domingo, após o ocorrido, Taison deu declaração consciente sobre igualdade e direitos, com referências aos Racionais e ao movimento Black Power, que ganhou o mundo nas Olimpíadas de 1968.
O recado do atacante é extremamente lúcido. Numa sociedade racista, não basta ser racista, é preciso ser também antirracista. O brasileiro também agradeceu o apoio recebido.
- "Amo minha raça, luto pela cor, o que quer que eu faça é por nós, por amor... “. Jamais irei me calar diante de um ato tão desumano e desprezível! Minhas lágrimas foram de indignação, de repúdio e de impotência, impotência por não poder fazer nada naquele momento! Mas somos ensinados desde muito cedo a sermos fortes e a lutar! Lutar pelos nossos direitos e por igualdade! O meu papel é lutar, bater no peito, erguer a cabeça e seguir lutando sempre! ✊🏿 Em uma sociedade racista, não basta não ser racista, precisamos ser antirracista! O futebol precisa de mais respeito, o mundo precisa de mais respeito! Obrigada a todos pelas mensagens de apoio! Seguimos a luta ...✊🏿 Net rasizmu - publicou.
Conivência perpetua preconceitos
Não foi a primeira, não foi a segunda nem será a última vez que casos de racismo e intolerância vão acontecer em estádios de futebol.
No entanto, a conivência de autoridades e responsáveis pelo esporte ajudam a perpetuar tais fatos. É urgente que personagens que mandam no futebol atuem para fechar cada vez mais o cerco contra racismo, misoginia e homofobia no esporte.
Enquanto se calam frente a esse problema, tornam-se corresponsáveis das injustiças no mundo do futebol. Fifa, confederações e clubes precisam se unir e buscar uma saída de vez para solucionar a intolerância.
Chega! Isso não cabe mais. O respeito e a igualdade são para todos. O futebol se reinventa, e ele será capaz de superar esse atraso.
Tivemos alguns episódios de racismo no futebol na Europa afetando diretamente dois atletas brasileiros (Taison e Dentinho) e mais um episódio lamentável hoje no Mineirão.
— Vasco (@VascodaGama) November 11, 2019
Até quando haverá impunidade?#ChegaDePreconceito#RacismoNuncaMais pic.twitter.com/zdeROmfXet